Quando a parte litiga sem auxílio do advogado

No juizado especial cível assistência jurídica é dispensada, no entanto juiz precisa correlacionar os interesses. -- Por Beatriz Fruet de Moraes Juíza de direito no Paraná -- (Bonijuris #674 Fev/Mar 2022)

Beatriz Fruet de Moraes JUÍZA DE DIREITO NO PARANÁ

O escopo do acesso à justiça na efetivação dos direitos e na pacificação social somente será alcançado se exercido de maneira efetiva, deixando de ser uma mera construção doutrinária e legal e passando a existir, de fato, na sociedade.

Após uma longa fase de controle ao acesso e exercício da jurisdição estatal durante o período ditatorial, a Constituição Federal de 1988 elevou este direito à condição de fundamental, prevendo no seu art. 5º, inc. XXXV, que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

É certo que a criação e a instalação dos juizados especiais a partir da Lei 9.099/95 promoveu a ampliação, ainda que formal, do acesso à justiça, ao prever diversas possibilidades, algumas até então inexistentes no sistema jurídico brasileiro, como a dispensa do recolhimento de custas iniciais sem a necessidade de comprovação de hipossuficiência financeira, a possibilidade de litigar sem a assistência de advogado em causas de até 20 salários-mínimos, a previsão de novos atores no processo como o juiz leigo, conciliador, dentre outros.

No entanto, para que o intento inicial do efetivo incremento do acesso à justiça seja de fato observado é indispensável mais do que a mera previsão legal, sendo esperado dos participantes do processo, especialmente do juiz de direito, que promovam medidas adequadas à sua implementação na prática. Para tanto, é pertinente debruçar-se na análise da seguinte problemática: qual o papel esperado do juiz de direito na condução do processo e na gestão do sistema dos juizados especiais cíveis, a fim de que as medidas de incremento do acesso à justiça, de fato, sejam observadas na prática processual?

A hipótese da pesquisa é a de que se faz de vital importância uma atitude proativa do juiz de direito na garantia do acesso à justiça, sem o descuido da observância da imparcialidade, da paridade de armas e do equilíbrio processual, garantias mínimas de um processo do estado democrático do direito.

1. O ACESSO À JUSTIÇA: EVOLUÇÃO E OBSTÁCULOS

A temática do acesso à justiça passou a ser debatida a partir do denominado “Projeto Florença”, que culminou na formação de uma série de textos denominados “Acesso à Justiça” que foram publicados nos anos de 1978 e 1979, sob a condução de Mauro Cappelletti e Bryant Garth.

Para esses autores, aliás, existiriam duas finalidades básicas a serem reconhecidas pelo sistema jurídico:

A expressão “acesso à Justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado que, primeiro deve ser realmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos. Nosso enfoque aqui será primordialmente sobre o primeiro aspecto, mas não poderemos perder de vista o segundo. Sem dúvida uma premissa básica será de que a justiça social, tal como desejada por nossas sociedades modernas, pressupõe o acesso efetivo.i

Verificou-se, neste contexto, a existência de três ondas caracterizadas pelas principais barreiras encontradas ao acesso à justiça efetivo, e que foram extraídas da diversidade de experiências que vinham sendo adotadas em 30 países (ainda que sem a inclusão do Brasil) para a ampliação do acesso à justiça no contexto da crise da administração da justiça vivenciada no final da década de 1960.

A primeira dessas três ondas observou a indispensabilidade do serviço judiciário gratuito às pessoas hipossuficientes financeiramente, sem os quais o acesso à justiça estaria impossibilitado. Já a segunda tratou do problema da representação judicial dos interesses difusos e coletivos no acesso à justiça. E, finalmente, a terceira propôs um novo enfoque para o acesso à justiça. Nos precisos dizeres de Mauro Cappelletti e Bryant Garth, “ela centra sua atenção no conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas”ii. Esses mesmos autores relataram:

De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos, individuais e sociais, uma vez que a titularidade dos direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação. O acesso à Justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos.iii

Parte-se da ideia, pois, de que o acesso ao sistema jurídico somente atingirá a pacificação social se for alcançado de maneira efetiva pelos interessados que pretendam reivindicar os seus direitos e resolver os litígios que de outra forma não obtiveram sucesso. Trata-se, pois, mais do que o mero ingresso no Poder Judiciário, mas sim do alcance de meios efetivos para a concretização do rol de direitos previstos

na legislação de um país, com a concretização da tão pretendida justiça social. Neste sentido é o pensamento de Carmen Silvia Fullin:

Entretanto, o que se compreende e o que se define por acesso à Justiça, assim como a invenção de uma problemática ligada a este tema, têm a ver com transformações históricas sobre a ideia de Estado e de seu papel na regulação da vida social. Por isso, se em um primeiro momento, o acesso à Justiça dentro de uma perspectiva liberal resumia-se ao entendimento de que todo cidadão tem liberdade para litigar em nome da defesa de seus interesses, nos anos 1960 esta interpretação foi severamente modificada. A partir de então, seu conteúdo foi revestido de um significado mais exigente, associado à ideia de promoção da igualdade social; tarefa esta, naquele momento, assumida em vários países que adotavam políticas de bem-estar (welfare state). Neste contexto, poder lutar no judiciário pela concretização desta igualdade passou a ser questão de justiça social; portanto, acessar a justiça deixou de significar somente a possibilidade de ter o judiciário à disposição, mas, além disso, dispor de condições reais (econômicas, culturais, institucionais) para acioná-lo.

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Foi neste contexto que as causas de menor relevância econômica passaram a ser vistas como de necessário enfrentamento tanto de ordem legislativa como em termos de implementação prática no Poder Judiciário, sobretudo diante da constatação de que os elevados custos para o acesso ao sistema jurídico inviabilizariam a propositura e solução de tais demandas. Conforme bem coloca Leslie Shérida Ferraz,

os juizados especiais foram concebidos para “facilitar o acesso à justiça”, a partir da constatação de que as causas de pequena expressão econômica não estavam sendo levadas à apreciação do Poder Judiciário – quer pela descrença generalizada deste órgão; quer pela desproporção entre o valor reclamado e os custos processuais; quer pela desinformação e/ou alienação da população brasileira (Dinamarco, 1998). Pretendia-se, assim, criar um sistema apto a solucionar os conflitos cotidianos de forma pronta, eficaz e sem muitos gastos.5

No Brasil, ainda que não tenha havido a participação no aludido Projeto Florença, iniciativas tímidas de enfrentamento às denominadas pequenas causas surgiram, inicialmente, em alguns estados da Região Sul. Nos anos 1980, alguns magistrados gaúchos criaram os denominados “Conselhos de Conciliação e Arbitragem” em que se objetivava a solução dos conflitos de baixo valor econômico de forma amistosa e informal, mediante o chamamento das partes a uma sessão destinada, sobretudo, à tentativa de conciliação, possibilitando, desta forma, o alcance de tratativas para a solução de conflitos que dificilmente chegavam ou chegariam ao Poder Judiciário6.

Foi o embrião, pois, da criação e posterior publicação da Lei 7.244/84, em que foram criados os então denominados juizados especiais de pequenas causas, primeiro órgão do Poder Judiciário com a finalidade precípua de resolver causas de menor complexidade e que, por esta via, ampliava claramente o acesso à justiça.

Guilherme Augusto Bittencourt Corrêa7 ainda indica que os objetivos deste novel juizado equipararam-se ao que posteriormente veio a ser consolidado na Constituição Federal de 19888, qual seja, a efetiva abertura das portas do Poder Judiciário às causas de pequeno valor econômico que anteriormente não possuíam espaço para conhecimento e solução pelos juízes brasileiros. E ainda sobre estes avanços legislativos, nas precisas palavras de Daniela Monteiro Gabbay, Susana Henriques da Costa e Maria Cecília Araujo Asperti,

a pauta de acesso dessa legislação, como se vê, buscava priorizar e dar acesso a quem era alijado do Poder Judiciário por obstáculos formais e financeiros; ou seja, buscava dar acesso aos marginalizados em relação aos mecanismos oficiais de solução de conflitos, àqueles que não tinham acesso à Justiça.9

Em 1995 finalmente foi promulgada no Brasil a Lei 9.099/95, com o objetivo de ampliar e consolidar o tratamento até então existente para as causas de menor complexidade, assim consideradas as de reduzido valor econômico e outros casos específicos que a lei indicar expressamente, restando criado um sistema informado por princípios próprios, quais sejam, a oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual, celeridade e autocomposição, ademais de rotinas procedimentais simplificadas e novos atores processuais.

A introdução do novo sistema ampliou de maneira imediata e formal o acesso à justiça no Brasil, como bem esclarecem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

A doutrina atual tem-se debruçado sobre a questão do acesso à Justiça, mostrando que o processo tradicional brasileiro é incompatível com grande parte dos direitos da sociedade atual, em especial, com as situações típicas da sociedade moderna (como os direitos transindividuais), as relações de consumo e as relações pulverizadas no conjunto social), e com os direitos individuais não patrimoniais. Na verdade, conclui-se que, praticamente, o processo tradicional apenas se mostra adequado para atender algumas pretensões patrimoniais, capazes de ser convertidas em perdas e danos, sendo completamente inadequado para atender aos chamados “novos direitos”.10

O objetivo inicial, portanto, foi aumentar a gama de oferta de prestação jurisdicional, possibilitando que muitas causas de menor complexidade, sobretudo econômica, que permaneciam contidas e não alcançavam o Poder Judiciário em razão da ausência de custo-benefício para o respectivo ingresso e solução

jurisdicional, pudessem ser resolvidas, propiciando maior grau de satisfação da coletividade e até mesmo de incremento a que estas relações fossem mais respeitadas na realidade fática porque poderiam, num futuro próximo, ser levadas ao crivo do órgão jurisdicional. Neste sentido é a lição de Araken de Assis:

Os juizados especiais se destinavam, originariamente, a aumentar a oferta jurisdicional, gerando um grau maior de pacificação social e solucionando, com brevidade e custos menores e mínimos, econômicos e sociais, conflitos que, em geral, nem sequer eram apreciados ou obtinham solução pelos órgãos jurisdicionais. Visam os juizados especiais a abrandar (erradicar parece impossível) o fenômeno da litigiosidade contida. […] O sucesso da experiência dependerá, em grande parte, de dois fatores: (a) da renovação da mentalidade dos operadores e (b) da criação da estrutura material adequada.11

No entanto, ainda que o avanço legislativo no sentido da ampliação do acesso à Justiça no Brasil, especialmente com a edição da Lei 9.099/95, tenha sido manifestamente expressivo, a constatação do efetivo acesso depende da superação de alguns obstáculos que vêm sendo apresentados e que são de diversas ordens.

Um primeiro ponto relevante ao se pensar nestes aludidos obstáculos, especialmente para as causas de reduzido valor econômico, é, sem dúvida, a já aludida questão econômica. Não é atrativo para a pessoa envolvida numa causa de reduzido valor dispender recursos consideráveis para a obtenção da respectiva solução, mormente se estes recursos ultrapassarem o valor objeto da controvérsia.

Foi relevante, pois, a previsão da lei quanto à dispensa do pagamento das custas iniciais, mas soma-se a isto a possibilidade efetiva da litigância sem a assistência de advogado nas causas de até 20 salários-mínimos, porque, ademais de ser mera possibilidade, muitas vezes a parte não dispõe de recursos financeiros nem de interesse em ser patrocinada por um advogado voluntário retribuído pelo Estado, que sequer teve a oportunidade de escolher. Neste sentido, o fato de estar litigando sem advogado pode facilitar o acesso à justiça, mas por si só constitui um obstáculo quanto a um possível desequilíbrio gerado na relação processual, que deve merecer a observação dos atores do sistema. Sobre o tema é a lição de Felippe Borring Rocha:

Na elaboração da Lei 9.099/95, o legislador procurou afastar alguns dos entraves comuns aos procedimentos tradicionais, que poderiam comprometer a eficácia dos Juizados. Ocorre que, entre os obstáculos identificados pelo legislador, está o advogado, justamente aquele que tem a missão constitucional de promover o acesso à Justiça (art. 133 da CF). Assim, como não poderia proibir a atuação do advogado, a Lei dos Juizados Especiais criou uma distinção no que tange à capacidade postulatória: nas causas de até 20 salários mínimos, atribuiu às partes, tanto no polo ativo como no passivo, a possibilidade de exercer diretamente a capacidade postulatória, independentemente de sua capacidade técnica.12

Um segundo obstáculo ao acesso efetivo ao sistema jurídico, e não menos importante, está relacionado a fatores sociais e culturais que vão desde o desconhecimento dos direitos e da forma de defendê-los, até mesmo o uso e o entendimento da linguagem jurídica predominante nos tribunais brasileiros e comumente utilizada nos processos judiciais. Neste sentido é a preciosa contribuição de Olívia Alves Gomes Pessoa:

Quanto aos obstáculos sociais e culturais ao efetivo acesso à justiça por parte das classes populares, a distância das pessoas em relação à administração da justiça é tanto maior, quanto mais baixo é o estrato social a que pertencem. Portanto, essa distância não tem apenas causas econômicas, mas também fatores sociais e culturais (CAPPELLETTI e GARTH, 1988). Em primeiro lugar, os cidadãos economicamente mais vulneráveis tendem a conhecer menos os seus direitos, e assim, possuem mais dificuldade em reconhecer um problema que os afeta como sendo jurídico, e isso os faz ignorar os direitos em jogo e as possibilidades de reparação jurídica. Em segundo lugar, mesmo reconhecendo o problema como jurídico, e um direito, é necessário que a pessoa se disponha a interpor uma ação, indivíduos economicamente vulneráveis hesitam muito mais do que os outros em procurar a justiça.13

É certo e notório, especialmente para as partes desprovidas de advogado, que além do desconhecimento da existência e extensão dos direitos que eventualmente possuem frente aos mais diversos fatos e aspectos da vida, o acesso ao entendimento da linguagem costumeiramente utilizada nos tribunais é dificuldade que os afasta do processo e do próprio sistema da jurisdição, e, por demais, notório obstáculo ao efetivo acesso à justiça. Neste sentido é interessante a interpretação de Carmen Silvia Fullin:

Há, em paralelo, um conjunto de fatores sociais e culturais interligados e não menos decisivos. […] ou seja, a transformação de um conflito em uma demanda judicial é apenas uma das alternativas, não necessariamente e nem a mais provável. Para isso, é necessário não somente o conhecimento dos direitos disponíveis, mas o reconhecimento de que o problema vivenciado lesou um direito exigível juridicamente. Realizada esta etapa, é preciso haver disposição para litigar contra quem lesou tal direito.14

Não se deve descuidar, igualmente, do próprio uso da tecnologia, cada vez mais presente na promoção do acesso à justiça e amplificada de maneira exponencial durante o período da pandemia da covid-19, que, por certo, constitui manifesta barreira à parcela da população ainda distanciada desta realidade.

É cada vez mais frequente, portanto, a própria estruturação de uma Justiça mais tecnológica, com a padronização dos processos virtuais, do acesso ao sistema pelos chamados balcões virtuais, da realização das audiências no formato virtual, do encaminhamento de petições via e-mail e das intimações realizadas pelas mais

diversas possibilidades eletrônicas, como o aplicativo whatsapp, por exemplo. Resta deste contexto, pois, a natural existência de barreiras aos desprovidos do alcance da tecnologia (os “excluídos digitais”15), com bem pontua Thaís Amoroso Paschoal:

A promoção do acesso à justiça passa, inevitavelmente, pela superação das barreiras linguísticas, tecnológicas e estruturais. É preciso repensar os espaços, permitindo a adequada participação democrática, para o que, muitas vezes, a própria estrutura física do Poder Judiciário é prejudicial. É necessário, também, que se crie ferramentas voltadas à superação das barreiras linguísticas, bem como que se garanta a devida assistência jurídica a todos aqueles que dela necessitem. A medida exige, como já se disse, o fortalecimento dos órgãos vocacionados à defesa dos direitos de pessoas e grupos em situação de vulnerabilidade, como a Defensoria Pública. Essas medidas devem ser ainda mais desenvolvidas quando se agrega à prestação jurisdicional um novo elemento: o uso da tecnologia. A quarta revolução industrial exige que se pense o acesso à justiça a partir de questões estruturais.16

Ao tempo, pois, em que o acesso à justiça é matéria de grande avanço nas legislações e na realidade do Poder Judiciário, obstáculos inerentes ao próprio sistema ainda são encontrados, sendo necessário o estudo do seu alcance para que soluções possam ser encontradas.

Assim, é importante o questionamento do papel do juiz de direito enquanto supervisor e gestor do sistema dos juizados especiais no trato de todas as questões e barreiras que envolvem o acesso à justiça.

2. O RITO SUMARÍSSIMO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS: PECULIARIDADES PARA INCREMENTO DO ACESSO À JUSTIÇA

Com a ideia precípua de proporcionar um incremento no acesso à justiça, a Lei 9.099/95 não só introduziu um novo rito processual, mas também criou um novo microssistema com atores próprios, que somente poderá ter a efetividade inicialmente planejada se as ações forem devidamente orientadas pelos seus princípios informadores.

Esta novel sistemática foi influenciada pela denominada “terceira onda” do movimento de acesso à justiça, que foi capitaneado por Mauro Cappelletti e Bryant Garth, no chamado Projeto Florença, o qual objetivou a sistematização da diversidade de experiências que vinham sendo adotadas em 30 países (ainda que sem a inclusão do Brasil) no contexto da crise da administração da justiça vivenciada no final da década de 1960 por estes mesmos países. Nesta esteira, é a lição de Carmen Silvia Fullin a respeito da chamada “terceira onda”:

É marcante em tal onda de reformas o deslocamento ou desvio de determinado tipo de conflituosidade para estruturas menos formais de

solução de litígios, nas quais o juiz togado tem uma atuação totalmente reformulada. Nelas, ele deixa de protagonizar a produção do desfecho, posicionando-se de modo mais periférico. Trata-se de um afastamento ligado à abertura de uma atuação mais propositiva das partes em conflito, conferindo poder a personagens inéditos na cena judicial, como conciliadores, mediadores e árbitros. Entende-se que, uma vez mais afastadas de um processo decisório centrado no juiz togado, acima e distante das partes, e envolto em complexos procedimentais, as partes podem ter acesso a decisões mais rápidas, participativas – e, por isso, mais definitivas – e também menos custosas.17

Tratou-se, pois, de uma tentativa de trazer ao contexto da solução, sobre o crivo do Estado, demandas que não alcançavam este patamar além da circunstância das próprias pessoas envolvidas, proporcionando um acesso fácil e com a ideia de colocar as partes em pé de igualdade para a resposta dada ou encontrada e limitada ao contexto da demanda. Comenta Olívia Alves Gomes Pessoa:

Os juizados especiais são reflexo das tentativas do estado e da sociedade de encontrarem soluções para resolver os problemas e os litígios da convivência humana, com o objetivo de um juízo célere, simples, eficaz, descomplicado, mais oral do que escrito, para atender as demandas de menor complexidade. Estas tentativas tiveram início com os movimentos de reforma do judiciário na Europa no início do século 18, como por exemplo, os movimentos de reforma denominados “oralidade” que se ocuparam essencialmente com a “livre apreciação” e o contato direto entre juízes, partes e testemunhas, bem como a tentativa de colocar as partes em pé de igualdade (CAPPELLETTI e GARTH, 1988).18

O art. 2º da Lei 9.099/95 informa que o procedimento nos juizados especiais cíveis deve orientar-se pelos critérios da “oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando sempre que possível a conciliação ou a transação”.

A norma introduz regra norteadora da interpretação do caminho que os processos devem seguir ao tramitarem nos juizados especiais cíveis, sendo de observância obrigatória por todos que atuam no sistema e precisam interpretar as suas disposições para aplicação da lei. São, portanto, os princípios processuais que orientam tanto a elaboração da norma como a sua interpretação e aplicação. No esclarecimento de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:

Todo o regime previsto nessa lei deve orientar-se por esses critérios, sob pena de comprometer o sistema como um todo. As regras dispostas a respeito do procedimento exigem que o intérprete que as examina tenha em mente tais princípios, pois somente assim se poderá adequadamente lidar e manejar o poderoso instrumento previsto por esta Lei.19

Esta constatação assume grande relevância diante da necessidade do intérprete e aplicador das normas no sistema dos juizados especiais observar a sua atuação no contexto em que se apresenta o próprio sistema, que é composto pela Lei 9.099/95, ademais das Leis 10.259/01 (juizados especiais federais) e 12.153/09 (juizados especiais da fazenda pública), bem como pela aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.

A atuação, portanto, no sistema dos juizados especiais exige a interpretação sistemática das suas três leis específicas, sem perder de vista o contexto subsidiário do Código de Processo Civil que, por ser posterior às aludidas leis, pode trazer ao intérprete dificuldades na aplicação da norma, ademais de ter introduzido um sistema jurídico diverso do preconizado pelas leis dos juizados especiais, o que faz com que os problemas de orientação e interpretação nesse sistema adotem necessariamente o norte preconizado pelo art. 2º da Lei 9.099/95 (princípios informadores).

São relevantes os ensinamentos de Joel Dias Figueiredo Júnior, ao tratar do contexto específico dos juizados especiais da fazenda pública, mas que são lições a serem observadas em todo o sistema:

Nessa toada, haverá o intérprete de visitar primeiramente a Lei 10.259/01, porquanto fonte originária e inspiradora direta da Lei 12.153/09, tendo servido de verdadeiro modelo a ser copiado e adequado para os Juizados da Fazenda Pública; em sequência, encontrando omissão na Lei dos Juizados especiais Federais, haverá então de visitar a Lei 9.099/95, fonte primária dos juizados e, por isso, detentora de maior completude legislativa, nos planos processual e procedimental. Por último, passará o intérprete a buscar subsídios no Código de Processo Civil, sem, contudo, perder de vista os princípios orientadores dos juizados especiais cíveis, recepcionados no art. 2º da Lei nº 9.099/95.20

Quanto aos princípios em si, tem-se a oralidade, inicialmente, como o processo em que a palavra falada predomina em face da escrita. Não está a significar, pois, que o feito não terá de ser registrado por escrito, mas sim que os atos orais estão à disposição das partes para que os seus direitos sejam alcançados de forma mais efetiva. É por meio da oralidade que o juiz tem maior proximidade com as partes, podendo ouvi-las e compreender melhor o conflito, entendendo quais as provas são necessárias e proferindo uma sentença mais próxima da solução efetiva da lide. Como componentes importantes deste princípio, tem-se nas palavras de Joel Dias Figueira Júnior:

Tomando por fulcro o pensamento precursor de Chiovenda, quatro aspectos podem ser associados ao chamado processo oral: a) a concentração dos atos processuais; b) a identidade física do juiz; c) a irrecorribilidade (em separado) das decisões interlocutórias; e d) a imediação.21

Traço marcante da oralidade é ainda que, “além de simplificar o procedimento, põe as partes em contato mais próximo com o Juiz, levando, pelo menos em tese, a um julgamento mais justo e racional”22.

Já a simplicidade deve ser entendida como a adoção da linguagem simplificada no processo a fim de aproximar as partes do Judiciário e, sobretudo da solução do conflito, como corolário do efetivo acesso à Justiça. Nos dizeres precisos de Guilherme Augusto Bittencourt Corrêa, “além de o procedimento ser simples, a linguagem empregada também deve ser, já que deve mostrar acessível a todos e, uma linguagem rebuscada e com termos jurídicos inúteis, acaba afastando o verdadeiro ‘público-alvo’”23.

A informalidade, por sua vez, pretende definir no processo que as formas não essenciais ao ato jurídico sejam eliminadas, fazendo com que apenas aquelas essenciais à sua existência devam ser praticadas. Entendem-se como essenciais, pois, as que respeitam as garantias fundamentais, ou, nas palavras de Marinoni, Arenhart e Mitidiero, “desde que atendidas as garantias fornecidas aos litigantes, todo ato processual deve ser reputado como válido, desde que atingida sua finalidade (art. 13 da Lei 9.099/95)”24.

De outro lado, entende-se por economia processual a prática do menor número de atos processuais com o alcance do maior resultado possível. Ou nos dizeres de Felippe Borring Rocha, “tirar o máximo de proveito de um processo é torná-lo efetivo, ou seja, capaz de apresentar soluções para os problemas que são a eles submetidos”25.

O princípio da celeridade, de outro verte, busca que os atos processuais praticados por todos os sujeitos do processo alcancem a sua finalidade no menor tempo possível, sem comprometer a segurança jurídica. Deve-se, pois, equilibrar a rápida solução do litígio com o respeito às garantias fundamentais à existência e validade do processo, sobretudo àquelas indicadas no art. 5º da Constituição Federal.

Finalmente, o enfoque concedido à autocomposição das partes prega que, sempre que possível, haverá o incentivo à solução consensual, em qualquer fase do procedimento, que deverá ser incentivada pelo juiz, o que acabou ganhando maior relevância com a entrada em vigor no Código de Processo Civil de 2015, ademais do incentivo que vem sendo dado pelo Conselho Nacional de Justiça quanto ao tema (Resolução 125/10).

Partindo destes princípios, trouxe a aludida lei peculiaridades próprias, visando tornar o acesso à Justiça mais simplificado e facilitado, alcançando os que, sem tais incrementos, permaneceriam na seara da litigiosidade contida. Nestes termos, elucidam Marinoni, Arenhart e Mitidiero que

o procedimento dos juizados especiais cíveis estaduais é nitidamente distinto do normal, previsto pelo Código de Processo Civil, visando, de um lado, atender aos critérios informativos do instituto (art. 2º da Lei 9.099/95), e de outro fornecer mecanismos apropriados para a tutela dos interesses que se inserem na competência do órgão.26

Quanto ao procedimento sumaríssimo em si, de início, para a propositura da ação, a parte pode encaminhar a sua petição de forma escrita ou oral à secretaria do juizado, sendo dispensável a assistência de advogado nas causas cujo valor não ultrapasse 20 salários-mínimos. A parte reclamante27 pode, neste contexto, comparecer pessoalmente à sede dos juizados e formular o seu pedido oralmente, sendo que um servidor local reduzirá a termo, de forma sucinta, os fatos, os fundamentos, o pedido e a qualificação das partes.

No processo eletrônico28, a parte reclamante pode encaminhar a sua petição com os respectivos documentos diretamente ao sistema de processos virtuais, ou também via e-mail à secretaria do juizado, com a inserção respectiva por um servidor do mesmo, e, finalizado o encaminhamento, há a designação automática da data para a audiência inicial de conciliação, para a qual já há a devida intimação do proponente.

Quando da edição da Lei 9.099/95, ainda vigorava o Código de Processo Civil de 1973 e a previsão de uma audiência inicial obrigatória de conciliação no sistema dos juizados especiais cíveis constituiu uma importante inovação, adotada posteriormente pelo Código de Processo Civil de 2015 em seu art. 334.

É pertinente ressaltar que para esta audiência inicial, assim como para as demais com previsão no procedimento sumaríssimo, é essencial a presença pessoal das partes para o incentivo à conciliação, ainda que estejam acompanhadas por advogado, cominando a lei severas consequências para a parte que devidamente intimada deixa de comparecer pessoalmente sem motivo justificado, diferente, pois, da sistemática hoje adotada pelo CPC de 2015.

No sistema da lei, três atores processuais são de importância manifesta no processamento em si: o juiz togado, o juiz leigo e o conciliador (ou mediador). O primeiro supervisiona todo o sistema e gerencia o processo, e o seu papel será melhor apreciado no item 4 deste estudo. Já o segundo conduz a audiência de instrução e julgamento, colhendo as provas pertinentes e resolvendo os incidentes, bem como apresenta o respectivo projeto de sentença que será submetido à apreciação do juiz togado, devendo também, sempre que possível, reiterar, às partes, os benefícios da autocomposição. Finalmente, o conciliador preside as audiências de conciliação com o objetivo de informar às partes as reais vantagens da solução consensual, auxiliando no encontro da melhor solução proveniente dos próprios sujeitos da controvérsia, muitas vezes através da utilização da técnica de concessões recíprocas visando a um consenso que atenda aos interesses de ambas as partes.

Quanto à presença desses atores processuais e a importância da participação do povo na administração da Justiça, pondera Joel Dias Figueira Júnior:

Por seu turno, seguindo a linha preconizada pela “terceira onda” da ciência instrumental civil em que se busca um processo de resultados ou verdadeiramente efetivo, encontramos no microssistema dos juizados especiais a figura tão propalada por Mauro Cappelletti, quando se referia à democratização do Judiciário, na qual uma de suas facetas apresentar-se-ia por intermédio da justiça participativa, ou seja, pela integração harmoniosa do povo da administração da justiça, em prol da simplificação,

agilização e aproximação da comunidade na resolução de seus conflitos intersubjetivos, de maneira a reduzir-se gradativamente a litigiosidade contida e, sobretudo, enfatizar-se a autocomposição, mediante a intervenção desses terceiros auxiliares.29

Não obtida a conciliação, as partes podem deliberar pela adoção da arbitragem, mediante a escolha de um árbitro, dentre os disponíveis no cadastro do juizado especial cível respectivo, que prosseguirá na condução da demanda até solução final a ser homologada pelo juiz togado.

Caso a lide não seja resolvida pela autocomposição das partes, nem seja instituída a arbitragem, o feito prossegue com a designação de audiência de instrução, se as partes pretenderem a produção de prova oral (depoimento pessoal, oitiva de testemunhas, inquirição de um especialista ou técnico e exibição de documento ou coisa). Até esta audiência é possibilitado ao reclamado apresentar contestação, na forma escrita ou oral, a qual poderá ser na sequência impugnada pela parte reclamante.

Encerrada a fase instrutória, o juiz leigo pode apresentar o projeto de sentença a ser submetido à apreciação do juiz togado ou poderá haver a apresentação de sentença diretamente por este, seja nos casos de discordância quanto ao projeto apresentado pelo juiz leigo, seja nos casos de julgamento antecipado ou, finalmente, quando o próprio juiz de direito presidir a audiência de instrução e julgamento.

Os únicos recursos admissíveis no sistema dos juizados especiais cíveis são os embargos declaratórios da sentença ou do acórdão e o recurso inominado da sentença, ocasião em que todas as decisões interlocutórias proferidas nos processos poderão ser atacadas, uma vez que não há a previsão de agravo.

Apreciado o recurso inominado pela turma recursal, a parte vencedora pode, caso não haja o adimplemento voluntário da obrigação, ingressar com o competente cumprimento de sentença e iniciar a fase de execução forçada, com a prática de atos executivos tendentes à satisfação da obrigação.

Ressalta-se, ainda, a possibilidade do ingresso perante os juizados especiais cíveis de ações de cunho executivo (ações de execução por título extrajudicial), consubstanciadas em títulos com força executiva e destinadas à satisfação da respectiva obrigação nele representada, as quais, por óbvio, devem respeitar o limite dos valores de alçada do sistema (até 40 salários-mínimos).

Registro importante, ainda, é concernente à desnecessidade do pagamento de despesas processuais30 para acesso ao sistema dos juizados especiais em primeiro grau de jurisdição, independentemente da comprovação de hipossuficiência financeira, sendo devido, entretanto, o pagamento das custas integrais caso a parte sucumbente pretenda apresentar o correspondente recurso inominado por discordância da sentença prolatada.

3. O JUIZ DE DIREITO E AS CAUSAS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS EM QUE A PARTE LITIGA SEM A ASSISTÊNCIA DE ADVOGADO

Como dito anteriormente, nas causas com valor econômico de até 20 salários- mínimos, a assistência por advogado é dispensada para as partes litigantes no sistema dos juizados especiais. Quer isto significar que, tanto na posição de reclamante como na de reclamado, a parte poderá estar em juízo (jus postulandi) sem a representação ou assistência de um advogado regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil e, “assim, em tais causas, as partes excepcionalmente têm capacidade postulatória, isso é, capacidade para realizar atos técnicos do processo”31.

A situação pode ser uma boa opção da parte, que pode não estar interessada em contratar um advogado pelos custos e demandas que esta opção acarretará, ou até mesmo receber a indicação sem custo de um advogado que não teve a oportunidade de escolha e possivelmente será pago pelo Estado, no caso de hipossuficiência econômica comprovada.

Entretanto, se uma das partes estiver no processo assistida por advogado ou se o reclamado for pessoa jurídica ou empresário individual, ou mesmo se a natureza da causa recomendar, o juiz deverá alertar à parte desprovida de advogado da conveniência do patrocínio, indicando, ainda, a possibilidade de valer-se do órgão responsável pela prestação de assistência jurídica no local de abrangência do respectivo juizado32.

É evidente que a intenção do legislador ao prever este comando foi facilitar o acesso à justiça, simplificando as barreiras que a escolha e contratação de um advogado poderiam apresentar para o acesso ao Judiciário, ao mesmo tempo que acabou por reconhecer que o fato de uma parte estar assistida por advogado e a outra não, ou a circunstância de encontrar-se no polo passivo pessoa jurídica ou empresário individual, conduz a um natural desequilíbrio na relação jurídica processual, sobretudo porque se estará litigando sem assistência técnica e diante de outra parte, ao menos em tese, suficientemente amparada.

Não se desconsidera, ainda, que a pessoa jurídica ocupante do polo passivo muitas vezes possui corpo jurídico próprio altamente especializado, conhecedor das demandas e litigante frequente e contumaz, de muito acostumado às lides jurídicas, o que por evidente pode desequilibrar uma relação jurídica em que a outra parte sequer possui conhecimento dos seus direitos ou consegue compreender a linguagem frequentemente utilizada no meio forense. Sobre este tema, Carmen Silvia Fullin destaca ponderações relevantes:

Além de questões referentes ao que impede o livre consumo dos serviços judiciários pelo cidadão, ou o que podemos chamar de barreiras externas ao acesso à justiça, alguns estudiosos focam suas análises no modo como o sistema de disputa judicial compromete a paridade, isto é, “a igualdade de armas” entre as partes em litígio. Mais do que saber se os cidadãos têm iguais condições de servirem-se das instituições judiciárias, eles têm entendido que é preciso verificar se, uma vez dentro dele, esta igualdade se mantém. […] Marc Galanter (1974) chama a atenção para as assimetrias que se reproduzem, a despeito da aparente neutralidade das regras do jogo, quando em confronto o que denomina “jogadores habituais” (repeat players) e “participantes eventuais” (oneshotters). Os primeiros

correspondem aos que comparecem regularmente em juízo, envolvidos em litígios sempre muito semelhantes. […] Já os “participantes eventuais” correspondem aos que pouco frequentam os tribunais, em geral pessoas físicas com pouca ou nenhuma experiência com serviços jurídicos”.33

Entretanto, se mesmo devidamente alertada, a parte decidir exercer a capacidade postulatória que lhe foi conferida por lei como uma medida de incremento do acesso à justiça, tal situação deverá ser resguardada com a concretização da opção da parte, cabendo questionar e investigar qual o papel do juiz de direito enquanto supervisor do sistema dos juizados especiais para o equilíbrio desta relação jurídica processual que já teria nascido naturalmente desequilibrada. E, ainda, se no exercício deste papel, excepcional no sistema jurídico processual até então vigente no Brasil, haveria o comprometimento dos mandamentos essenciais à função jurisdicional e ao próprio devido processo legal, como a imparcialidade e a independência34 do juiz, o resguardo à paridade de armas (contraditório) e equilíbrio da relação jurídico-processual, garantias mínimas de um processo do estado democrático de direito.

Ressalta-se, que o tão só fato de uma ou ambas as partes estarem no processo sem a assistência de um advogado pressupõe que, a princípio, estarão demandando pessoas sem o conhecimento do direito, seja do processo, do direito material em si ou da própria estrutura judiciária, fazendo com que haja a necessidade de maior “acolhimento” destas pessoas para que alcancem a justiça.

E nisto reside, portanto, o ponto principal deste trabalho uma vez que se parte da ideia de que não basta apenas que os litigantes alcancem o Poder Judiciário, mas sim como deverá ser a receptividade deste para com aqueles num sistema em que atuarão com capacidade postulatória própria.

Reputo de grande relevância o questionamento e as soluções respectivas porque, somente assim, estar-se-ia trazendo a efetividade a um acesso à justiça que muito foi pensado e estruturado para que as causas de menor complexidade econômica não estivessem limitadas ao conceito de litigiosidade contida.

E a efetividade aqui tratada é a que condiz com o pensamento de Olivia Alves Gomes Pessoa, para quem “a efetividade pode ser entendida como a capacidade da justiça de resolver os conflitos que chegam até aquela, a capacidade de apresentar uma resposta ao cidadão que acionou o Judiciário”35.

O avanço a este contexto conduz, necessariamente, ao encontro da temática da efetividade do acesso à justiça elevada por Mauro Cappelletti e Bryant Garth ao patamar de não apenas um direito social fundamental, mas também o ponto primordial da moderna processualística, a fim de que o resultado a ser buscado pelas partes seja oriundo de um processo conduzido com paridade de armas:

Embora o acesso efetivo à Justiça venha sendo crescentemente aceito como um direito social básico nas modernas sociedades, o conceito de “efetividade” é, por si só, algo vago. A efetividade perfeita, no contexto de um dado direito substantivo, poderia ser expressa como a completa “igualdade de armas” – a garantia de que a condução final depende

apenas dos méritos jurídicos relativos das partes antagônicas, sem relação com diferenças que sejam estranhas ao Direito e que, no entanto, afetam a afirmação e reivindicação dos direitos. Essa perfeita igualdade, naturalmente, é utópica. As diferenças entre as partes não podem jamais ser completamente erradicadas. A questão é saber até onde avançar na direção do objetivo utópico e a que custo.36

Partindo-se dessas premissas, entendo que sem dúvida a primeira concepção para o alcance da justiça por aqueles que sem os incrementos estariam desprovidos da solução dos seus conflitos sociais de menor complexidade é a existência de um juiz ativo, muito diferente daquele tradicionalmente formal e reservado. Mas o que seria este juiz de direito ativo, com uma postura proativa?

Um juiz de direito proativo e atento às circunstâncias do processo é um profissional observador da existência de uma relação jurídica processual em natural desequilíbrio originário da existência de uma parte, ou mesma de ambas as partes, litigando com capacidade postulatória própria. É, portanto, um juiz que atua em prol da efetiva justiça ao caso em concreto, propiciando que as naturais barreiras ao mero debate das questões jurídicas no processo sejam transpostas sem ofensas ao devido processo legal.

O primeiro passo, portanto, deve ser a conscientização desta necessidade de atuação proativa no sistema e no processo, proporcionando que os resultados a serem alcançados sejam originários do debate que as partes puderam trazer ao processo em relação aos fatos e fundamentos jurídicos subjacentes ao pedido. Nesse sentido, ainda, é o pensamento de Cappelletti e Garth:

Nos Estados Unidos, o exagerado sistema de neutralidade judicial tem sofrido críticas consideráveis desde o famoso discurso de Roscoe Pound, em 1906. Atualmente, admite-se em geral que a utilização de um juiz mais ativo pode ser um apoio, não um obstáculo, num sistema de justiça basicamente contraditório, uma vez que, mesmo em litígios que envolvam exclusivamente duas partes, ele maximiza as oportunidades de que o resultado seja justo e não reflita apenas as desigualdades entre as partes.37

Nos parâmetros introduzidos pela Lei 9.099/95, o juiz é não apenas o condutor do processo cível instaurado a partir do requerimento da parte, mas também o gestor de todo o sistema criado para enfrentar as causas de menor complexidade e, nesta condição, assume a relevante função de coordenador e supervisor de todos os atores processuais, fazendo, desta forma, chegar a devida assistência ao litigante desprovido.

Trata-se, com relevância, de uma alteração da própria mentalidade de condução do sistema judicial, partindo-se do pressuposto natural e intrínseco de que há uma defasagem natural ao leigo no alcance ao Poder Judiciário, sendo de todo necessário e até esperado um conjunto de atitudes proativas do juiz para superação dos obstáculos

à existência da relação jurídica a mais próxima do equilíbrio possível. Esta também é a conclusão de Guilherme Augusto Bittencourt Corrêa:

O Estado admite a propositura e acompanhamento de determinadas espécies de causas sem a assistência de um advogado, como forma de efetivar e ampliar o acesso à justiça. Porém, não se pode compreender esse acesso à justiça como um mero direito de acesso aos órgãos do Poder Judiciário, um mero direito de petição. Esse acesso à Justiça deve ser amplo, para que as partes que litigam sem a assistência de um advogado também exerçam esse direito de acesso à justiça, que, sobretudo visa garantir um processo justo com uma posterior decisão justa.38

Atento a toda normativa existente quanto à supervisão do sistema dos juizados especiais cíveis, seja originária do próprio tribunal local, seja do Conselho Nacional de Justiça, deve o juiz togado exercer o treinamento e fiscalização de todas as pessoas que trabalhem no sistema, desde aqueles que estão no setor de triagem inicial e recebem a parte que procura o juizado para apresentação de uma reclamação oral ou escrita, até os servidores e estagiários que estão na secretaria, passando pelos conciliadores e juízes leigos.

Todas essas pessoas que participam do sistema dos juizados especiais devem ser orientadas quanto à abrangência e alcance dos princípios informadores do sistema, ademais do conhecimento específico do rito, sendo capacitadas pelo juiz de direito a estarem disponíveis para assistir às partes desprovidas de advogado a respeito do funcionamento do sistema e do transcorrer do processo, como também dos seus direitos, ademais das consequências para a inércia ou abandono da parte.

Ainda, os participantes do sistema devem ter como ponto primordial de acolhimento das partes a utilização da linguagem que, realmente, possa ser do entendimento das pessoas, independentemente da classe social ou da cultura que possuam. De nada adianta num setor de triagem, ou mesmo na realização de uma audiência, que os responsáveis pelo processo se comuniquem com as partes com o uso de uma linguagem formal ou jurídica que não lhes traga conhecimento do que efetivamente está ocorrendo. É decorrência clara do princípio da oralidade, pois, não só o uso da palavra falada, mas também o uso de linguagem que possa ser da compreensão de todos, o que, inclusive, integra a garantia do acesso à justiça, na perspectiva da acessibilidade linguística.

Não são poucos os casos de pessoas que procuram diretamente o sistema dos juizados, nas pessoas dos seus servidores, especialmente para obtenção de esclarecimentos quanto ao processamento, quanto aos seus deveres e ônus enquanto na condição de parte, quanto à extensão dos seus direitos e, até mesmo, quanto à interpretação de despachos, decisões, atos ordinatórios ou petições da parte adversa.

É uma decorrência prática e importante da oralidade norteadora do próprio sistema, sendo de vital relevância a oitiva das pessoas que procuram o sistema em suas mais diversas questões, trazendo ao processo os seus reais anseios.

Ainda, em caso de qualquer dúvida, deve o juiz supervisor estar de pronto disponível para orientação específica, conduzindo os servidores e atores do processo

à prestação do melhor esclarecimento à parte que busca o Judiciário para a efetivação dos seus direitos ou apenas que se contrapõe às alegações da outra parte.

O mesmo deve ser aplicado aos conciliadores e juízes leigos, chamados para atuar em colaboração nos processos de competência dos juizados especiais conforme os critérios previstos em lei, mas que devem observar as orientações e entendimentos do juiz supervisor do sistema dentro da esfera de suas atribuições.

Quanto ao juiz leigo, cabe a consideração de que, por ser o responsável muitas vezes pela colheita da prova oral, ele é sem dúvida o que melhor possui condições de extrair as consequências jurídicas advindas das provas produzidas durante a audiência de conciliação, até mesmo para apresentar o projeto de sentença com base na equidade, se for o caso, porque a sua percepção diante da proximidade da prova oral será, muitas vezes, diversa daquele que não a colheu. Mas, ainda neste contexto, a sua liberdade de atuação não é plena e vasta, devendo sempre agir sob a supervisão do juiz togado a quem compete orientar quanto ao seu agir e quanto aos seus deveres de esclarecimentos para com as partes, imbuído, sobretudo, pelos critérios orientadores da informalidade, da simplicidade e da oralidade.

Ao juiz de direito, portanto, compete a promoção e a indicação de encontros, palestras, cursos e reuniões para capacitação de todas essas pessoas no cenário do sistema dos juizados especiais cíveis, orientando a cada qual a importância do papel de esclarecimento às partes que estão no processo sem a assistência de um advogado, porque somente com a compreensão haverá o efetivo acesso à justiça por tais jurisdicionados.

Muito importante, portanto, será o comportamento e a atitude de todos os integrantes do sistema dos juizados especiais, sobretudo no acolhimento da parte desprovida de advogado para que tenha conhecimento do rito e do funcionamento da Justiça, conduzindo a que estes fatores, por si só, não atrapalhem o julgamento ao final e para que o resultado desejado pelo direito material seja alcançado, qual seja, o de uma resposta ao cidadão que buscou o Judiciário para um fim específico. Nestes termos é a conclusão de Olivia Alves Gomes Pessoa em estudo específico quanto ao acesso à Justiça e as audiências nos juizados especiais cíveis do DF:

A aposta de estruturas mais acessíveis como os juizados especiais pressupõem adesão dos atores envolvidos nesta dinâmica, especialmente os agentes do poder judiciário (servidores e magistrados), a um conjunto de novos valores, que orientam a adoção de novas práticas, atitudes e postura. Porém, os atores presentes nos juizados são formados nos mesmos moldes dos atores das instituições tradicionais, logo as premissas, tais como a celeridade e simplicidade são aplicadas quando operacionalizadas por uma cultura jurídica formalista e um cenário de acesso à justiça altamente desigual. Os procedimentos jurídicos e a linguagem técnica específica muito se distanciam da linguagem comum, logo, novas estruturas construídas sob alicerces de velhas estruturas correm o risco de estarem contaminadas com os antigos hábitos.39

Já no processo propriamente dito em que litigam a parte ou as partes sem a assistência de advogado, o primeiro cuidado a ser adotado pelo juiz de direito diz respeito ao uso da linguagem em suas decisões ou despachos de mero ordenamento do processo, bem como a correta orientação aos servidores que também atuam no processo para que em todo o ato praticado (atos ordinatórios, certidões, termos de audiências, entre outros) também seja adotada linguagem simples e de fácil compreensão por um leigo na área do direito.

É crucial a adoção de linguagem compatível ao entendimento de qualquer pessoa que não tenha frequentado a faculdade de direito, sendo relevante que ao proferir ou praticar os atos do processo seja objeto de seus pensamentos a seguinte pergunta: será que o receptor da ideia por trás desta decisão, despacho ou simples ato do processo terá condições de entender a mensagem que desejo transmitir, considerando que, muitas vezes, até o entendimento da língua portuguesa pode restar comprometido para este jurisdicionado por questões de ordem cultural, social ou econômica? É neste sentido, o ensinamento de Olívia Alves Gomes Pessoa:

O uso abusivo do chamado “juridiquês” – emprego de vocábulos de difícil compreensão a fim de elitizar a linguagem e segregar poder – no discurso jurídico pode trazer consequências irreversíveis à justiça e à sociedade (SANTANA, 2012), uma vez que o cidadão e cidadã que tenha que utilizar o sistema de justiça não compreende o processo e na maioria dos casos não é protagonista neste processo.40

Na fase postulatória nos juizados especiais cíveis, tratando-se de parte em exercício da capacidade postulatória plena, assume grande relevância o princípio da oralidade, desde a interposição da petição inicial ou da defesa até mesmo no transcorrer dos demais atos do processo. As partes, assim, devem ser chamadas ao processo para esclarecimento do que ocorreu no mundo dos fatos e de suas reais pretensões, sempre que a prática de um ato processual, como o entendimento das peças do processo, a realização das audiências, seja de conciliação ou de instrução, a determinação da produção de provas, dentre outras, restar impossibilitada por ausência de compreensão quanto ao real alcance das pretensões.

Quando do recebimento de um e-mail da parte autora com a respectiva petição inicial, por exemplo, pode o juiz de direito convocar o respectivo autor a comparecer no fórum e explicar melhor os fatos e as suas pretensões a um servidor que deverá tomar a termo as declarações para serem juntadas ao processo. Se ainda no transcorrer do processo essas explicitações não restarem claras, pode o conciliador ou o juiz leigo, no transcorrer das respectivas audiências que presidir, tomar por termo as declarações da parte propiciando esclarecimentos ao processo, sem prejuízo, é claro, do exercício do contraditório pela parte adversa quando se fizer necessário.

O exercício da oralidade encarado desta maneira permite que o conflito instaurado venha ao processo na forma como ele realmente é, sem que reste dissolvido ou escondido nas palavras muitas vezes não tão precisas das partes, levando o juiz de direito à solução efetiva da lide.

Já na fase instrutória do processo, ademais de verificar quais provas são necessárias ao julgamento do pedido, indicando às partes de forma clara a sua importância ao processo, deve o juiz de direito, sempre que for importante ao real entendimento do conflito, designar a audiência de instrução e julgamento para, ao menos, ouvir as partes, de modo que os fatos possam vir ao processo de maneira mais precisa, sem prejuízo, é claro, da oitiva de testemunhas ou do técnico de confiança do Juízo, quando for necessário ao julgamento.

Neste caso, poderia ser que o processo prescindisse da produção da prova oral para o perfeito julgamento do pedido formulado pelo autor, mas sopesando a condição de partes que estejam no processo no exercício da capacidade postulatória plena, a sua presença em Juízo para esclarecimento dos fatos pode, muitas vezes, conduzir a um julgamento mais justo e realmente próximo de um processo em que há paridade de armas entre os litigantes.

Além disso, considerando que as partes que litigam com a capacidade postulatória própria muitas vezes sequer compreendem as provas que devem produzir, cabe ao juiz de direito, no uso dos seus poderes instrutórios amplos, determinar de ofício a prova documental a ser produzida, determinando que a parte traga aos autos todos os documentos relativos aos fatos discutidos ou, até mesmo, qual documento em específico seria relevante e necessário ao julgamento do pedido formulado.

Pode-se dizer, inclusive, que o ônus subjetivo da produção probatória resta, neste ponto, comprometido, uma vez que a parte que litiga sem a assistência de advogado muitas vezes não sabe de antemão o que precisa provar no processo, sendo dever do juiz proativo, assim, indicar nos autos quais os documentos seriam essenciais ao julgamento do pedido, inclusive invertendo o ônus da prova nas hipóteses legais, alertando, ainda, que a ausência de documento essencial poderá conduzir ao julgamento conforme as regras objetivas do ônus da prova.

Finalmente, na fase executiva do processo nos juizados especiais, nada mais quer a parte vencedora do que a concretização do seu direito, seja aquele reconhecido numa fase de conhecimento, seja numa ação de execução por título extrajudicial. Ou seja, superada a fase de conhecimento, o que pretende a parte exequente, por óbvio, é a concretização de sua pretensão, com a realização da obrigação determinada na sentença ou no acórdão respectivo.

Em sendo assim, e como muitas vezes a parte na condição de exequente desconhece quais medidas executivas poderia solicitar ao juízo, nada impediria que o juiz de direito decretasse as medidas destinadas à satisfação da obrigação de ofício, respeitando todos os direitos inerentes ao contraditório e à ampla defesa da parte adversa.

Pensar em sentido oposto a isto poderia levar a parte executada a ocupar posição de privilégio diante da parte exequente que, apenas por desconhecer as medidas que poderia requerer no processo para consagração da obrigação constante do título executivo, teria suas pretensões frustradas com a possibilidade, inclusive, de extinção do processo por ausência de localização de bens do devedor.

É possível ao juiz de direito, portanto, determinar a realização de medidas tendentes à satisfação da obrigação de ofício, tal como realizar atos nos sistemas Sisbajud, Renajud ou Infojud, objetivando conhecer da situação patrimonial do

devedor e ofertar ao exequente a possibilidade de escolha de quais medidas pretende que sejam realizadas, sem desconsiderar a oferta do contraditório e da ampla defesa sempre que necessário.

CONCLUSÃO

Buscou-se, neste estudo, avaliar o papel do juiz de direito no processo de competência dos juizados especiais cíveis, especialmente, nos casos em que a parte litiga sem a assistência de advogado, ou seja, com sua capacidade postulatória plena.

Como ponto de partida, o trabalho situou o contexto evolutivo da temática do acesso à justiça e alguns dos seus principais obstáculos, passando pela previsão legal existente no Brasil para o tratamento no Poder Judiciário das causas de menor complexidade econômica.

Avaliou-se o rito processual sumaríssimo e as possibilidades conferidas às partes neste sistema para incremento do acesso à justiça, muitas delas em manifesta inovação ao que vinha sendo anteriormente praticado no Brasil.

Como resultado, a conclusão obtida é a de que o juiz condutor e gestor do sistema dos juizados especiais cíveis precisa se conscientizar da necessidade de desenvolver uma postura proativa tanto na condução do processo como no exercício da efetiva supervisão de todos os atores do mesmo, desenvolvendo o comprometimento técnico e institucional dos servidores, estagiários, conciliadores, mediadores e juízes leigos acerca da preocupação inerente ao “acolhimento” ao Judiciário da parte desprovida de advogado para a resolução dos seus conflitos que, sem este incremento, não sairiam da esfera da litigiosidade contida.

Esta postura e consciência é premissa básica ao equilíbrio das relações jurídicas que nascem naturalmente desequilibradas, justamente porque a lei proporciona a abertura ao Poder Judiciário da presença do “leigo” na área do direito, como medida de incremento do acesso à justiça.

Portanto, para que os ideais preconizados por Cappelletti e Bryant na proposta de um novo enfoque do acesso à justiça, concretizados no Brasil, principalmente com o advento da Lei 9.099/95, sejam de fato implementados, é essencial que o juiz de direito conduza o sistema dos juizados especiais cíveis de forma proativa, trazendo entendimento, compreensão e paridade de armas aos litigantes e proporcionando, ao final, a solução que melhor correlacione os interesses das partes ao direito material e à justiça ao caso em concreto.

BEATRIZ FRUET DE MORAES

Quando a parte litiga sem auxílio do advogado/doutrina, 1

Quando a parte litiga sem auxílio do advogado/doutrina, 1

FICHA TÉCNICA // Revista Bonijuris Título original: O juiz de direito e as causas n

sem a assistência de advogado. Title: The judge of law and the cases in special civil courts in which the party litigates without the assistance of a lawyer. Autora: Beatriz Fruet de Moraes. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pós-graduanda em Processo Civil pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar. Juíza de Direito no Paraná há 15 anos. beatrizfruet@hotmail.com. Resumo: Justifica-se o questionamento do papel do juiz de direito como supervisor e gestor dos juizados especiais, pois foram criados para facilitar o acesso da população mais simples ao Judiciário. Nas causas com valor econômico de até 20 salários mínimos, a assistência por advogado é dispensada para as partes litigantes, tanto na posição de reclamante como na de reclamado. Mas é essencial que o juiz conduza o sistema de forma proativa, trazendo entendimento, compreensão e paridade de armas aos litigantes desassistidos, proporcionando solução que melhor correlacione os interesses das partes ao direito material e a justiça ao caso concreto. Abstract: The questioning of the role of the judge of law as supervisor and manager of special courts is justified, as they were created to facilitate the access of the simpler population to the judiciary. In cases with an economic value of up to 20 rewards, assistance by a lawyer is waived for the litigants, both in the position of claimant and defendant. But it is essential that the judge conducts the system proactively, bringing understanding, understanding and parity of weapons to unassisted litigants, providing a solution that better correlates the interests of the parties to substantive law and justice to the specific case. Data de recebimento: 29.09.2021. Data de aprovação: 29.11.2021 Fonte: Revista Bonijuris, vol. 34, n. 1 – #674 – Fev/Mar 2022. Editor: Luiz Fernando de Queiroz, Ed. Bonijuris, Curitiba, PR, Brasil, ISSN 1809-3256 (juridico@bonijuris.com.br).

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WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: procedimentos especiais e juizados especiais. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, v. 4. i CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1988, p. 3. ii Idem, p. 25. iii Ibidem, p. 3. 4 FULLIN, Carmen Silvia. Acesso à justiça: a construção de um problema em mutação. Manual de Sociologia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 219/220. 5 FERRAZ, Leslie Shérida. Acesso à justiça: uma análise dos Juizados Especiais Cíveis no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010, p. 27. 6 CORRÊA, Guilherme Augusto Bittencourt. O papel do condutor do processo (juiz togado, juiz leigo e conciliador) no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais. Curitiba, 2010. 258 f. Dissertação de mestrado em Direito. Universidade Federal do Paraná, p. 26/27. Disponível em: https://bit.ly/3EfN54V Acesso em: 15 jun. 2021. 7 Idem, p. 28-29. 8 “Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I – Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau”. 9 GABBAY, Daniela Monteiro; COSTA, Susana Henriques da; ASPERTI, Maria Cecilia Araujo. Acesso à justiça no Brasil: reflexões sobre escolhas políticas e a necessidade de construção de uma nova agenda de pesquisa. RBSD – Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 6, n. 3, p. 152-181, set/dez. 2019, p. 160. 10 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil: tutela dos direitos mediante procedimentos diferenciados. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, v. 3, p. 317. 11 ASSIS, Araken de. Execução civil nos Juizados Especiais. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, v. 3, p. 14. 12 ROCHA, Felippe Borring. Manual dos juizados especiais cíveis estaduais: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2019, p. 71. 13 PESSOA, Olívia Alves Gomes. Audiências no juizado especial cível no Distrito Federal: quem fala com quem? Brasília, 2016. 110 f. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual de Brasília, p. 23/24. Disponível em: https://bit.ly/3rFMBSr Acesso em: 15 jun. 2021. 14 FULLIN, Carmen Silvia. Op. cit., p. 223. 15 O CNJ editou, recentemente, a Recomendação nº 101, de 12/07/2021, que tratou deste tema ao recomendar “(…) aos Tribunais brasileiros a adoção de medidas específicas para o fim de garantir o acesso à Justiça aos excluídos digitais”. Disponível em: https://bit.ly/3lorcZM Acesso em: 11 set. 2021. 16 PACHOAL, Thaís Amoroso. Acesso à justiça, Tecnologia, e o nosso realismo esperançoso de cada dia. In: FUX, Luiz; ÁVILA, Henrique; CABRAL, Trícia Navarro Xavier (coords.). Tecnologia e justiça multiportas. Indaiatuba: Foco, 2021, p. 137. 17 FULLIN, Carmen Silvia. Op. cit., p. 228/229. 18 PESSOA, Olívia Alves Gomes. Op. cit., p. 35/36. 19 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil: tutela dos direitos mediante procedimentos diferenciados. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, v. 3, p. 318/319. 20 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Juizados Especiais da Fazenda Pública: comentários à Lei n. 12.153 de 22 de dezembro de 2009. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 52. 21 Idem, p.28. 22 CORRÊA, Guilherme Augusto Bittencourt. Juizados Especiais Cíveis Estaduais: Acesso à Justiça? Revista Eletrônica do CEJUR v. 1, n. 3, 2008, p. 92. Disponível em: https://bit.ly/3obzear Acesso em: 14 ago. 2021. 23 Idem. 24 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 321. 25 ROCHA, Felippe Borring. Op. cit., p. 31. 26 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 333. 27 Sobre o uso desta expressão para a denominação das partes no rito sumaríssimo: “Nomenclatura mais adequada aos padrões do Juizado, já que visam a atender as demandas de pessoas de mais baixa classe social, portanto com a nomenclatura Reclamante e Reclamado, ao invés de Autor e Réu ou Requerente ou Requerido, as pessoas sentem-se mais à vontade e mais familiarizadas com o ambiente do processo”. In: CORRÊA, Guilherme Augusto Bittencourt. Juizados Especiais Cíveis Estaduais: Acesso à Justiça? Revista Eletrônica do CEJUR v. 1, n. 3, 2008, p. 94. Disponível em: https://bit.ly/31jtB19 Acesso em: 14 ago. 2021. 28 Atualmente no Estado do Paraná, todas as ações novas iniciadas devem observar o processo eletrônico (Projudi). 29 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Juizados Especiais da Fazenda Pública: comentários à Lei n. 12.153 de 22 de dezembro de 2009. Op. cit., p. 108. 30 A Lei nº 9.099/95 destaca em seu art. 55 a desnecessidade do pagamento de “(…) custas, taxas e despesas”, amplificando, pois, o alcance da gratuidade. 31 WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: Procedimentos Especiais e Juizados Especiais. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, v. 4, p. 375. 32 Vide art. 9º, parágrafos 1º e 2º da Lei nº 9.099/95. 33 FULLIN, Carmen Silvia. Op. cit., p. 224/225. 34 “O que é mínimo e imprescindível para que se possa configurar o devido processo legal? Observação primeira é a de que se cuide de garantia vinculada a processo jurisdicional, isto é, a processo em que é figurante um juiz, com todas as exigências que o fato de ser juiz impõe necessariamente. E eles são, em síntese, a mais estreita possível, a imparcialidade e a independência. Ausente qualquer dessas notas, desnatura-se a condição do juiz, do que resulta o desvirtuamento da garantia do processo. Só é devido processo legal o processo que se desenvolve perante um juiz imparcial e independente.” In: PASSOS, J.J. Calmon. O devido processo legal e o duplo grau de jurisdição. Revista da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: n. 25, 1982, p. 133. 35 PESSOA, Olívia Alves Gomes. Op. cit., p. 39. 36 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Op. cit., p. 6. 37 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Op. cit., p. 29. 38 CORRÊA, Guilherme Augusto Bittencourt. O papel do condutor do processo (juiz togado, juiz leigo e conciliador) no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais. Curitiba, 2010. 258 f. Dissertação de mestrado em Direito. Universidade Federal do Paraná, p. 130. Disponível em: https://bit.ly/2ZFXfNa Acesso em: 15 jun. 2021. 39 PESSOA, Olívia Alves Gomes. Op. cit., p. 92/93. 40 PESSOA, Olívia Alves Gomes. Op. cit., p. 27.

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